Para professor belga, ensino domiciliar acolhe desejos de estudantes

O acadêmico belga Jan De Groof, um dos principais estudiosos do ensino domiciliar, argumenta que essa modalidade educacional tem valor porque “faz as perguntas corretas”. Em palestra realizada em Brasília ontem (13), a convite do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), ele disse que a sociedade deve levar em conta não só os sistemas que são oferecidos pelas escolas e pelo governo, mas também as vias alternativas escolhidas por pais que os contestam.

Entre as preocupações de De Groof evidenciadas no evento estão os discursos ideológicos que podem ser difundidos a partir do ambiente escolar tradicional. Em sua fala, o professor catedrático, que foi conselheiro da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) na área de direito à educação, sublinhou que acredita ser necessária a preservação da autonomia de pensamento, uma vez que a educação pode ser definida como “a transmissão de crenças, valores e cultura”.

Para ele, o papel do Estado no tocante à educação, é claro: “O Estado deve regulamentar [a educação] e estabelecer padrões mínimos.” A Constituição da Bélgica, destacou, considera direito básico dos cidadãos o acesso à educação, mas não torna obrigatória a assiduidade nas escolas.

Ele esclareceu ainda que o homeschooling, como é também chamada a educação domiciliar, dá ênfase ao acolhimento dos desejos dos estudantes, abrindo a possibilidade, inclusive, de escuta daqueles que se desanimam com a ida à escola por sofrer bullying.

Na avaliação do professor, os setores da sociedade são corresponsáveis pela educação. Ele também defende que o direito à educação é o segundo mais essencial, ficando atrás somente do direito à vida.

“Há uma corresponsabilidade entre os pais, a família, a escola, o educador, a sociedade e o Estado. Precisamos nos manter céticos quanto à influência do Estado sobre a mente da criança”, afirmou.

A rede de colégios do país europeu é, segundo o pesquisador, majoritariamente formada por instituições não governamentais. Ao todo, calcula ele, 75% delas têm essa característica, sendo muitas delas católicas, judaicas e protestantes. O perfil se aproxima com o que existe na Holanda, segundo o estudioso.

Exigências

Durante a palestra, o acadêmico também comentou que, na Bélgica, são exigidos dos pais ou responsáveis que aderem ao ensino domiciliar um cadastro formal, a apresentação de um plano pedagógico, com detalhamento das metas de aprendizado, e a aprovação do aluno por meio de provas. Essas mesmas etapas estão citadas no projeto de lei elaborado pelo governo brasileiro e que deverá ser aprovado pelo Congresso Nacional para passar a ter validade.

A regulamentação do homeschooling consta das 35 metas prioritárias dos 100 primeiros dias do governo Jair Bolsonaro.

Entendimento do STF

No ano passado o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu não reconhecer essa modalidade de ensino, por entender que não há no país uma lei que autorize a medida.

Durante a discussão no STF, manifestaram-se contrárias ao homeschooling a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Procuradoria-Geral da República, que argumentou que a modalidade “não encontra fundamento próprio na Constituição Federal”.

Demanda

A demanda por regulamentação do ensino domiciliar foi levada ao governo pela Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned). O último levantamento da associação, de 2018, mostra que 7,5 mil famílias educam os filhos em casa – número que representa mais que o dobro das 3,2 mil famílias identificadas em 2016.

A estimativa é de que 15 mil crianças recebam, hoje em dia, educação domiciliar, em todo o país. Ao divulgar a ideia de editar uma MP, o governo federal informou que a expectativa era de que o quantitativo de famílias saltasse para 31 mil.

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