Têm sido muitas, e por certo ainda o serão pelo menos por algum tempo, as homenagens a AMAZONINO ARMANDO MENDES, sentidas em sua grande maioria, certamente, algumas poucas convenientes, talvez, mas são vozes que se levantam, até em pranto, para falar do político mais importante deste tempo e nesta terra de Ajuricaba.
Ainda jovem, advogado e empresário do ramo imobiliário, Amazonino uniu-se a Gilberto Mestrinho – primeiro governador eleito após a redemocratização do País, nos idos de 1982, em pleito que disputou com o jovem deputado Josué Cláudio de Souza Filho, hoje Conselheiro aposentado do Tribunal de Contas do Estado – e com extraordinária capacidade política que demonstrou ao nosso Boto Governador, como Gilberto ficou conhecido, o Caboco, que depois viria a ser o Negão, foi indicado para assumir a Prefeitura de Manaus, com a exigida aprovação da Assembleia Legislativa, chegando ao Paço da Liberdade em 28 de março de 1983, para suceder o empresário João de Mendonça Furtado.
Amazonino levava para ali, nos primeiros passos do segundo governo de Gilberto – chefe do Executivo entre 1959 e 1963 e que devolveu o leme a Plínio Ramos Coelho, afastados ambos da vida pública pela denominada Revolução de 1964 – boa experiência na política estudantil, que liderou desde o hoje chamado ensino médio, articulando a condução à presidência da União dos Estudantes Secundaristas do Amazonas, nossa UESA – em eleição disputada com Manoel Neuzimar Pinheiro, agora desembargador aposentado de nosso Tribunal de Justiça – de TARCILA PRADO DE NEGREIROS, com quem viria a casar-se, sua companheira por longos anos, que se faria advogada, juíza e desembargadora federal do Tribunal Regional do Trabalho e cujo nome atribuímos, em 2018, a escola estadual de tempo integral que construímos em Humaitá. E também foi líder na Faculdade de Direito da hoje UFAM – uma das três primeiras escolas dessa espécie no Brasil – no Diretório Acadêmico, contribuindo para eleição de candidatos de Mário Haddad, depois deputado estadual e federal, como João Coelho Maciel, e na Associação Atlética, onde fez oposição a Roberto Gesta, que viria a ser presidente da instituição mundial de atletismo.
No comando da Prefeitura que dispunha de parcos recursos financeiros previstos no orçamento municipal, o Negão criou solução ousada para a carência de escolas que atendessem às crianças dos primeiros anos de ensino, e construiu tendas, usando ferro e lona, em várias praças de Manaus, dotadas de condições para receber alunos e professores em aulas nos dois turnos do dia. Era a primeira e eloquente demonstração de sua preocupação com o direito do pobre à educação, que o acompanharia por toda a longa vida pública. Sua força de trabalho e a coragem política que sempre demonstrou terminaram por fazer Amazonino apoiado por Gilberto para disputar o governo do Estado, que assumiu a 15 de março de 1987, dali saindo para candidatar-se ao cargo de Senador da República e passando o timão estadual para o vice-governador, que fora deputado federal e professor de Direito Vivaldo Barros Frota, de quem fui Secretário de Justiça.
Na Prefeitura, Amazonino foi sucedido por Manoel Henriques Ribeiro, candidato apoiado por Gilberto, de quem era vice-governador e que em seguida foi vencido pelo Negão em sua pretensão de candidatar-se a sucessor de Mestrinho. Ribeiro foi eleito em 1985 na primeira eleição direta em Manaus para aquele cargo e permaneceu prefeito até quando, no exercício de seu primeiro mandato de governador, Amazonino decretou intervenção municipal, levando ao comando da Prefeitura seu aliado e fiel companheiro Alfredo Nascimento, que mais adiante ele apoiaria para eleger-se Prefeito com a ajuda de Eduardo Braga.
Em 1 de fevereiro de 1991, o Negão assumiu o Senado da República, ao tempo em que o Amazonas voltou a ser governado por Mestrinho, eleito para segundo mandato posterior à redemocratização, em verdade o terceiro, e Manaus tinha como prefeito o ex-deputado federal Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto, com quem fui Procurador-Geral do Município e que derrotara Gilberto no pleito municipal. Logo depois, em 1992, Amazonino enfrentou nas urnas para o comando da Prefeitura o ex-deputado federal José Cardoso Dutra, que foi apoiado por Gilberto e por Arthur, e, derrotando Dutra, renunciou ao Senado, entregando o mandato a Gilberto Miranda, recebendo de Virgílio a direção do Município em 1 de janeiro de 1993. Naquele pleito, teve como candidato a vice-prefeito o jovem ex-vereador e deputado federal Eduardo Braga, a quem entregou a Prefeitura em abril de 1994, desimpedindo-se para disputar, pela segunda vez e com igual êxito, o Governo do Estado, chegando novamente ao Palácio Rio Negro no primeiro dia de janeiro de 1995, tendo como vice-governador o ex-prefeito interventor Alfredo Nascimento. Participei com ele dessa jornada exercendo o cargo de Secretário de Administração e depois o de Administração e Gestão.
Em 1998, Amazonino disputou a reeleição, novidade garantida pela chamada Constituição Cidadã cuja elaboração teve a relatoria do deputado amazonense José Bernardo Cabral, promulgada em festa política histórica e singular pelo Congresso Nacional a 5 de outubro daquele ano presidida pelo Deputado Ulisses Guimarães. Era a primeira reeleição que por aqui se dava e dessa feita foi companheiro de chapa o ex-secretário de finanças do Estado, doutor Samuel Hanan, tendo como adversário o deputado estadual e radialista Nonato Oliveira, que depois assumiria a Secretaria de Ação Social de Amazonino para, ao final, abandonar a política.
No exercício do segundo mandato de governador, o Negão criou os centros especializados em saúde da criança, como os do idoso, o 3º Ciclo com que buscou desenvolvimento econômico alternativo à Zona Franca, construiu centenas de escolas e de postos de saúde em todo o Estado, além de hospitais, como o Francisca Mendes, o 28 de Agosto ou o João Lúcio, e delegacias de polícia na capital e nos 61 municípios interioranos, o que terá contribuído para o sucesso de sua mantenção rumo ao terceiro mandato, quando teve como adversário o antigo aliado Eduardo Braga, ex-prefeito de Manaus. Naquele pleito, o Negão apoiou com sucesso a eleição de Gilberto Mestrinho para o Senado da República.
Em 1 de janeiro de 2003, entregou o governo estadual a Eduardo Braga, que apoiara como candidato, e na eleição que se seguiu, em 2006, disputou contra o já ex-aliado que terminou reeleito. Amazonino, então, foi disputar seu terceiro mandato de prefeito da Capital, derrotando o titular Serafim Fernandes Corrêa, que havia sido vereador e viria a ser deputado estadual. Em 2017, o ex-deputado José Melo de Oliveira teve cassado seu mandato de governador, que obteve em pleito disputado com Eduardo Braga, e o presidente da Assembleia, deputado David Almeida, assumiu o governo com o dever constitucional de convocar nova eleição. Foi o que permitiu a Amazonino chegar a seu quarto mandato de governador do Amazonas, o único de nossa História até aqui, que assumiu em 4 de outubro de 2017 e onde permaneceu até 31 de dezembro de 2018, derrotando Almeida que pretendeu reeleger-se. Fui, nesse governo, por ele convocado para dirigir a Secretaria de Educação.
No primeiro mandato, Amazonino criou o Instituto Superior de Estudos da Amazônia, que se compunha de representantes dos diferentes Estados da região e que chegou a ser dirigido por Luís Maximino de Miranda Correa. Com sede no prédio onde passou a funcionar o Teatro da Instalação, em Manaus, o ISEA não chegou a avançar significativamente na condição de embrião de uma universidade, centro de altos estudos e pesquisas como pretendia o governador que, retornando ao Executivo, constituiu, no segundo mandato, comissão incumbida de planejar a criação da Universidade do Trópico Úmido, quando contou com a contribuição de Randolpho Bittencourt, Aldemir Ramos e José Seráfico, dentre outros professores de nossa Universidade federal. Por motivo que desconheço, a ideia não avançou e o projeto nem mesmo chegou a ser encaminhado à apreciação da Assembleia Legislativa.
Em 2000, fui por ele convocado a retornar à equipe de governo, de que Robério participava com extraordinário trabalho realizado à frente da Pasta da Cultura, cuidando da restauração de prédios históricos, principalmente do Teatro Amazonas, do Palácio Imperial, do Palácio Rio Negro e do Largo de São Sebastião, além de criar orquestras e festivais, como o de Ópera que para aqui atraiu os olhos do mundo da música e das demais artes, e instituindo, por sugestão de José Braga, o Cláudio Santoro, escola de formação de músicos jovens que operou verdadeira revolução aqui e no Interior, principalmente em Parintins, para onde foi levado no governo de Omar Aziz – apoiado pelo Negão desde quando foi eleito vereador e Presidente da Câmara Municipal de Manaus, depois deputado estadual e vice-governador de Eduardo – e que chegou a ter mais de 20 mil alunos no centro de artes que Amazonino ali construiu e que ficou conhecido como Bumbódromo, incentivando e exponenciando o maior festival folclórico de que se tem notícia, hoje conhecido em todo o planeta.
Fui chamado para implantar, com status de Secretaria de Estado, a Comissão Estadual de Licitação, onde fizemos do Amazonas o primeiro estado da federação a implantar a novidade do pregão como procedimento licitatório então em teste no governo federal. Pouco depois, sem prejuízo da responsabilidade com a Comissão, fui incumbido de assumir novamente a Secretaria de Administração, que era também de Planejamento e Coordenação Geral, em virtude da saída, a pedido, de Isper Abrahim Lima, que foi integrar o corpo diretivo da SUFRAMA.
Foi quando tomei conhecimento do entusiasmo de Amazonino com experiência de formação de médicos a que assistira em Havana, Cuba, inspirando-o a criar uma faculdade de medicina, o que também animava o doutor Wilson Alecrim, diretor do Hospital de Doenças Tropicais, respeitado aqui e alhures como instituição de pesquisa. E fui incumbido, juntamente com Vicente Nogueira, secretário de educação, Ruy Cantanhede, secretário particular, Robério, secretário de cultura, e José Pacífico, chefe da casa civil, de negociar com faculdades e universidades particulares a compra de vagas para servidores públicos e seus dependentes. Em uma manhã de sábado do final do ano 2000, o Negão reuniu em sua casa os secretários Vicente Nogueira, Francisco Deodato, Robério Braga, Ruy Cantanhede, João Coelho Braga, José Alves Pacífico e eu, e foi quando, sabendo da impossibilidade de comprar vagas nas instituições privadas e por nossa instigação, decidiu criar a Universidade do Estado, bem mais que a escola de medicina, desde logo determinando que deveria cumprir papel essencial de interiorização, conforme já registrei em artigo anterior. Foi o que Pacífico e eu, incumbidos de elaborar o projeto, registramos, e a 12 de janeiro do primeiro ano do milênio o Negão sancionou a lei que autorizou o Poder Executivo a criar a nossa UEA, o que se consumou por via de decreto assinado, em reunião sem qualquer pompa, a 2 de fevereiro seguinte. No dia 3, nomeou a mim para a missão de primeiro reitor, acumulando com a de secretário de administração e presidente da Comissão.
Essa, de entre tantas, é a grande obra de uma vida vencedora de quatro décadas na política, porque, como registrei no dia seguinte à passagem de Amazonino para outros planos da vida, é possível derrubar todos os prédios construídos, os viadutos, as passagens de nível, tudo enfim, mas, à maneira do que se dá com os formados pelo Cláudio Santoro, o que a Universidade construiu, e continua a fazer, na consciência de cada caboclo, de cada cabocla, de cada índio, de cada índia, que já ultrapassam os 70 mil diplomados, não há força humana capaz de destruir. É obra eterna.
Agora, chamado pelo Pai, segue em paz, meu irmão.
Lourenço Braga, do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas